SÉRIE “COMO DISCERNIR NOSSO TEMPO”

Se existe algo do qual os cristãos não abrem mão (ou não deveriam) é a “verdade”. Do ponto de vista da fé cristã, existe uma verdade absoluta. Uma verdade que se revela à humanidade por meio de uma pessoa e que, portanto, pode ser conhecida. As pessoas podem não só conhecer esta verdade, mas também se relacionar com ela, de forma que essa relação traga implicações para todas as áreas da vida de quem conhece e se relaciona com a Verdade.

Aplicar o princípio teológico acima na vida real, nas relações e atividades humanas, é desafiador, especialmente num tempo em que advogar ser portador de uma verdade tornou-se confuso e embaraçoso, já que em nossa sociedade secularizada os absolutos foram retirados da cena e cada um passou a reivindicar a sua própria verdade, segundo seus próprios padrões e critérios, baseados em emoções e prazeres.

Esse desafio se estende também ao campo da comunicação e do jornalismo. Como o jornalismo pode zelar pela verdade? Afinal, no jornalismo existe verdade ou existem narrativas e interpretações? Como o cristão pode “consumir” material jornalístico de maneira que tal conteúdo o ajude a fazer uma leitura adequada dos fatos da sociedade?

O jornalismo é uma ferramenta fundamental para nos ajudar a discernir os nossos dias. Para isso, é preciso entender os mitos sobre o jornalismo, as dinâmicas de interesses e outros fatores que influenciam o fazer a jornalístico e, automaticamente, no conteúdo que chega até nós pelos diversos tipos de mídia.

O mito da imparcialidade. Os jornalistas evidentemente buscam imparcialidade e equilíbrio, mas existem decisões conscientes e inconscientes que geralmente impedem que isso aconteça. A mídia, e isso inclui o jornalismo, não é um espaço neutro, é um agente produtor de sentidos, com uma lógica de interpretação e construção da realidade, a partir de uma cosmovisão ou ideologias. Isso significa dizer que não existe imparcialidade no jornalismo. O profissional ou a empresa de comunicação, seja grande ou pequena, tem referências, financiadores, compromissos, objetivos, prioridades, linhas doutrinárias (no caso de canais de comunicação religiosos), etc. E tudo isso tem grande influência no que será noticiado ou não e de que maneira, com destaque ou uma pequena nota, com imagem ou apenas texto, no topo da página ou no rodapé. Observar esses detalhes ajuda a compreender os valores e os interesses do profissional ou do canal de comunicação.

Mito da liberdade e da racionalidade humana. As pessoas são livres para decidir? Sim e não, ou nem sempre. De forma consciente ou inconsciente, as pessoas são influenciadas ou condicionadas por seus desejos. No campo da comunicação, os meios têm a capacidade de condicionar a vontade dos seus espectadores para que esses ajam conforme se deseja. As pessoas tendem a acreditar no que desejam acreditar e quando se confrontam a emoção e a razão, normalmente é a razão que acaba por sucumbir. As pessoas agem muito menos movidas por suas convicções, suas ideias e seus princípios, e muito mais do que pensam movidas por seus sentimentos e desejos.

A busca pela verdade

No livro “Engolidos pela cultura pop: arte, mídia e consumo”, Steve Turner comenta que a Bíblia não nos diz como fazer uma notícia ou como analisar uma matéria jornalística, mas ela nos oferece princípios e valores que devem nortear nosso modo de pensar e agir, e isso serve tanto para cristãos que atuam na área jornalística quanto para os cristãos que vão consumir conteúdo jornalístico. O autor destaca:

“Não é errado ter suposições [Este artigo está cheio delas]. Eu suponho a existência de Deus. Não tento provar isso. A vida seria impossível sem suposições. Um cristão não é alguém livre delas, mas – assim espero – alguém que sabe de onde vêm suas suposições, alguém que acredita que há uma verdade absoluta, mesmo que nem sempre veja isso claramente e às vezes faça interpretações errôneas. […] É importante saber como perceber as suposições de forma a evitar que sejamos inconscientemente manipulados ou inconscientemente manipuladores. A visão cristã é que existe uma verdade objetiva em todas as situações. Isso não significa que sempre a encontraremos, mas significa que temos motivação, coragem, humildade e determinação para buscá-la.”

A jornalista Marília de Camargo comenta o que os cristãos devem ter em mente ao consumirem qualquer material jornalístico: “É sempre bom conhecer o canal da informação (jornal, revista, site, blog, rádio, web radio), saber quem são os controladores, como se posicionam politicamente, que agendas ocultas podem haver por trás daquele meio de comunicação. Mas veja bem – conhecer de verdade – e não porque ouviu dizer que tal jornal é de esquerda, ou tal tv é de direita. Conhecimento vem com boa leitura e com a soma de várias fontes de informação.”


Por Phelipe Reis,  jornalista e colaborador de conteúdo para o site Sepal.