A tarefa missionária é uma incumbência dada à Igreja de Cristo. Neste sentido, não se trata de uma atividade para alguns poucos irmãos e irmãs com um “chamado especial”. Ao mesmo tempo, sabemos que nem todos se dedicarão, por exemplo, em tempo integral na linha de frente em algum projeto, em outros países.

Cada cristão têm um lugar a ocupar no reino de Deus e uma maneira específica para contribuir com o cumprimento da missão. Muitos desafios são enfrentados por aqueles que se sentem chamados a deixar sua terra natal e irem a lugares distantes para proclamar e testemunhar o evangelho. A igreja que fica, agente enviadora, serve como base para sustentar, apoiar e encorajar os que vão.

Neste artigo, queremos explorar algumas dicas e sugestões que as igrejas, sejam comunidades ou indivíduos, podem desenvolver para apoiar os missionários que estão em campo transcultural, em terras distantes.

Para a produção deste conteúdo, conversamos com a experiente missionária Antonia Leonora van der Meer, carinhosamente chamada de Tonica. De acordo com ela, a igreja evangélica brasileira “faz muito pouco pelo missionário em campo, além de, em poucos casos, dar uma pequena ajuda financeira”. Ela acrescenta: “Várias igrejas cobram histórias de sucesso, e quando os frutos demoram a aparecer, pensam que o missionário é pouco efetivo e ameaçam cortar o sustento”.

Também entrevistamos o mobilizador de missões Rodrigo Gomes, da Missão Base. Ele falou sobre alguns pensamentos equivocados que muitas igrejas nutrem em relação ao trabalho do missionário transcultural. “O sustento financeiro é essencial, mas o missionário em campo precisa ser pastoreado, mentoriado e cuidado”, destaca Gomes.

Confira abaixo o bate-papo com Rodrigo e, ao final do texto, dicas práticas para apoiar missionários em campo transcultural.

Quais as ideias equivocadas mais comuns entre as igrejas sobre a vida do missionário em campo?

Rodrigo Gomes – Entre as igrejas evangélicas existe uma “teologia do sofrimento” que não é bíblica. É uma falsa ideia de que missionário deve sofrer e passar necessidades, como se isso fizesse parte do chamado missionário. Eu não creio dessa forma. Isso acontece, muitas vezes, por omissão da igreja. Outro problema é pensar que enviar o sustento financeiro é suficiente. Então, a igreja envia uma boa oferta em dinheiro e acha que está tudo bem. Uma pesquisa feita pela Missão Base há alguns anos mostrou que um dos grandes problemas do missionário em campo é a falta de pastoreio. O sustento financeiro é essencial, mas o missionário em campo precisa ser pastoreado, mentoriado e cuidado. Algumas igrejas também acham que o missionário é uma pessoa que não deu certo em nenhum lugar e, então, resolveu ser missionário, para dormir e acordar a hora que quiser, fazer o que quiser, como se fosse o “emprego dos sonhos”. Mas isso não é verdade e por isso que, no fundo, ninguém que ser missionário.

O que a igreja costuma fazer e que nem sempre é relevante para o missionário em campo?

Rodrigo Gomes – Tem muitas coisas que a igreja local costuma fazer e que não é prático e nem dá muito resultado para o missionário que está em campo. Uma delas são as viagens missionárias de curto prazo. O problema não são as viagens em si, a iniciativa é excelente para mobilizar a igreja e engajar pessoas na missão de Deus, mas na maioria das vezes isso não acontece. A razão é que, muitas vezes, a igreja está mais interessada em pegar um grupo grande e enviar ao campo para ter contato com o missionário sem antes buscar entender a realidade e as necessidades do campo. Sendo que isso é fundamental não só para aproximar o voluntário da realidade missionária, mas também para potencializar o trabalho no campo transcultural.

Para quem vai conhecer ou visitar um missionário em campo, uma dica importante é ouvi-lo para saber o que ele espera do grupo que vai fazer a visita, quais profissionais o campo necessita e como o grupo pode interagir com o projeto que já está sendo desenvolvido. Neste sentido, é muito válido quando missionário informa antecipadamente para a igreja as necessidades do local para que a igreja mobilize um grupo com pessoas específicas para atender o missionário e as necessidades do contexto.

Um grupo grande e aleatório pode causar muitos problemas, porque demanda que o missionário organize toda a logística, providencie alimentação e acomodações que o local nem sempre dispõe de estrutura para isso. O resultado é que consome muito a energia do missionário, especialmente quando o grupo fica disperso e acaba fazendo coisas que não foram orientadas a fazer, podendo prejudicar o trabalho do missionário e até fechar portas para o trabalho do missionário em campo.

Grupos menores podem ser mais efetivos. Podem ser grupos com técnicos ou profissionais que vão atender a necessidades específicas do campo. É muito importante ir com o coração disposto a servir, não para fazer “turismo missionário”, previamente orientado sobre o que vai fazer, onde, como, o tempo necessário, o momento para descanso, etc.

Dicas práticas para apoiar e encorajar missionários

As sugestões abaixo foram compiladas a partir das contribuições de nossos entrevistados, Tonica e Rodrigo. Podem ser colocadas em prática por igrejas ou por membros das comunidades, com o intuito e demonstrar preocupação, cuidado e amor com os missionários e suas famílias.

1. Divulgação. É importante divulgar mais a vida dos missionários nas igrejas. Podem fazer cartazes e exibir vídeos de ações missionárias durante os cultos.

2. Oração. A igreja precisa ser fiel na intercessão e comunicar isso aos missionários. É importante estar disposto a ouvir, não só os sucessos, mas as lutas, dificuldades e dúvidas, e oferecer apoio e encorajamento ao missionário.

3. Saúde e aposentadoria. A igreja enviadora, juntamente com a agência e o próprio missionário, precisam ter uma preocupação com a saúde e a previdência social. Por isso, é importante encontrar formar para ter um plano de saúde e pagar regularmente o INSS.

4. Momento missionário. Se sua igreja é no modelo em células (ou pequenos grupos), você pode mobilizá-las para promoverem o cuidado integral do missionário. Distribua entre as células nomes de missionários e em cada encontro do grupo podem ter o “momento missionário”, no qual terão alguns minutos para lerem uma carta missionária, orar pelos pedidos de oração e, se houver possibilidade, podem se conectar numa chamada de vídeo para conversar com o missionário em tempo real e ouvir suas necessidades.

5. Férias no exterior. Em muitas igrejas há famílias ou casais que tiram férias no exterior. As igrejas podem organizar e incentivar para que essas pessoas aproveitem as férias para visitar missionários que estão em outros países. Eu lembro de um casal que realizou uma viagem de uma semana para o exterior e foi visitar uma família missionária.  Naqueles dias, a mulher em viagem fez a faxina da casa para que a missionária pudesse descansar e o homem ajudou o missionário a organizar as finanças da família.

6. Envolver diferentes faixas etárias. Também é interessante envolver as crianças da igreja nessa aproximação com missionários em campo. As crianças podem escrever cartas para os missionários e seus filhos, e os adolescentes da igreja também podem estabelecer amizades com adolescentes filhos de missionários em campo.

7. Missionários em férias. Quando o missionário e sua família estiverem de visita em seu país de origem, aqui no Brasil, é legal alguém da igreja levá-los para passear, comer uma pizza, ir ao cinema ou fazerem alguma outra atividade de lazer, não apenas a eventos e atividades da igreja.

8. Necessidade e desejo. A igreja pode buscar identificar necessidades pontuais dos missionários para atendê-las. Certa vez, visitamos um casal de missionários na Indonésia e eles estavam com muito desejo de comer pão francês, que naquela região da Indonésia não existia. Um casal do Brasil que soube desse desejo mobilizou sua célula e compraram uma máquina de fazer pão, com a receita, ingredientes e mandaram pelo Correios para que essa família missionária pudesse comer pão francês na Indonésia.

9. Datas especiais. As igrejas podem ficar atentas a datas especiais, como aniversário de casamento, aniversários dos filhos dos missionários, etc. nessas ocasiões, a igreja pode enviar uma oferta especial ou um presente. Eu soube de uma célula que se juntou para fazer o aniversário do filho de uma missionária – ele gostava muito do Homem-Aranha. As pessoas da célula de juntaram, compraram os enfeites e descartáveis, como máscaras, chapeuzinhos, pratos, talheres, etc., compraram um presente para o menino, colocaram tudo numa caixa e enviaram para o local onde a missionária vivia. A célula também depositou uma oferta para que pudessem comprar docinhos e fazerem uma festa surpresa para aquela criança.

Tudo isso faz parte do cuidado integral do missionário, que é um uma excelente ferramenta para o envolvimento e para identificação da igreja com a vida do missionário em campo.


Por Phelipe Reis | Jornalista e colaborador de conteúdo para o site Sepal.

Leia mais

> Por que a igreja brasileira não envia mais missionários?
> Cuidado mútuo, um caminho para a maturidade da igreja
> Cuidar da pessoa: condição para nossa sobrevivência
> Captação de recursos: como lidar com a vilã do retorno precoce de missionários?