“O discipulado define a compreensão da essência da igreja”

Uma definição questionável de evangelho resultará em métodos questionáveis de evangelização. Precisamos compreender claramente as motivações e elementos de um crescimento saudável e abraçar com alegria a evangelização e plantação de novas igrejas.

Para fazer a mesma tarefa que Jesus fez em seu tempo, imbuído de sua preocupação pelo homem na completude de seu ser como Filho de Deus, temos que nos perguntar qual é o estilo, qual é a forma que corresponde ao dia de hoje.

Pensando sobre evangelização, hoje encontramos diversos modelos e métodos de evangelismo. São os mais variados possíveis, baseados na experiência pessoal, no marketing eclesial, no mundo empresarial, no corporativismo, nas técnicas de auto-ajuda, etc. Muitos se sentem frustrados só em pensar nas tantas opções. Mas será que cumprem a risca a grande comissão? Afinal, quais princípios Jesus seguiu para evangelizar as pessoas? Ele tinha algum tipo de plano mestre de evangelismo? Métodos preocupam-se mais com a metodologia do crescimento da igreja do que com a teologia do crescimento. A evangelização que resulta disso é mais estratégica que missiológica, mais prática que reflexiva, focalizando em “como” fazer evangelismo e não “o que” e “por que” evangelizar.

O evangelismo definido como “tornar-se membro da igreja” é um gigantesco reducionismo, inadequado ao testemunho dos apóstolos, ao mandato do discipulado de todas as nações, à proclamação do evangelho do Reino e ao entendimento do senhorio de Cristo sobre a história. Esta preocupação excessiva com “um Jesus que alivia a consciência, com uma cruz não-escandalosa, um reino de outra dimensão, um limitado espírito privativo e íntimo, um deus de bolso, uma bíblia espiritualizada e uma igreja escapista” foi criticada (e não ouvida) também por Orlando Costas. Seu objetivo é uma vida alegre, confortável e de sucesso, obtida através do perdão de uma pecaminosidade abstrata, pela fé num Cristo não-histórico.

O evangelho do crescimento da igreja torna-se basicamente um evangelho vertical, do relacionamento individual entre Deus e o ser humano. Ele focaliza a salvação pessoal e privativa, fazendo pouca menção da ênfase neo-testamentária sobre as dimensões do passado, presente e futuro da fé evangélica (1 Pe 1:3-10). Seus métodos e técnicas focalizam no “salvar almas” (e contá-las). A conversão é reduzida a um apelo ao altar ou àquele evento ou cerimônia quando a pessoa se incorpora publicamente à igreja.

Para Norman Kraus se entendemos salvação apenas como “receber Jesus como salvador pessoal” das conseqüências espirituais do pecado, então a pregação sobre a morte e ressurreição de Cristo para nossa justificação encampa também a missão. Mas se entendemos salvação como a vinda do governo de Deus “assim na terra como é no céu” então a missão da igreja, além da evangelização pessoal, inclui dimensões sociais e políticas mais amplas. Samuel Escobar acredita que, dentro do cenário Latino Americano, surgiu a crítica evangélica mais bem articulada contra aquilo que chama de missiologia gerencial do crescimento numérico da membresia da igreja como o principal elemento da missão cristã.

Contra este fácil triunfalismo das estatísticas e a tirania do controle de dados, o sucesso do avanço protestante na América Latina é interpretado com difíceis perguntas sobre o dinamismo transformacional na sociedade e sua contribuição para a justiça nas relações sociais. A base para este questionamento tem sido o claro compromisso com a tarefa da missão e evangelização, bem como sua busca consciente de realizar esta tarefa de acordo com os padrões bíblicos. Portanto, uma [nova] teologia contextual chamada de missão integral está se desenvolvendo; ela tenta integrar o zelo evangelístico com a paixão holística.

Mateus 28:18-20 mostra claramente que ser cristão representa tornar-se discípulo, aluno, aprendiz de Jesus. David Bosch resume bem isso quando afirma que esses três versos devem ser entendidos no contexto de todo o evangelho de Mateus. O discipulado define a compreensão da essência da igreja e é o clímax do chamado missionário do cristão. Ser um discípulo significa viver os ensinos de Jesus. Ser discípulo divorciado de uma vida de amor e justiça é impensável.

Discipulado envolve compromisso com o reino de Deus, justiça, amor e obediência a toda a vontade de Deus. Missão não pode se limitar a um sistema que faz das pessoas novas criaturas, garantindo a “segurança” de que, haja o que houver, elas serão “salvas”, pois tem o passe de entrada para o céu. Para Bosch, “Missão envolve, do começo ao fim, o tornar novos crentes sensíveis às necessidades dos outros, abrindo seus olhos e corações para reconhecer a injustiça, sofrimento, opressão e a luta daqueles que estão caídos pelas esquinas [da vida]”.