A cada ano que passa, tenho observado uma dinâmica disfuncional crescente em vários casamentos, que se agravou nesse período de pandemia que vivemos em nível mundial. Depois de analisar o pensamento, o humor e o comportamento de alguns cônjuges diante das crises que estão vivendo, cheguei à conclusão de que os casais estão se desconectando. Essa disfuncionalidade sempre existiu. Mas minha percepção é que no passado era menos frequente e se manifestava em casamentos acima de 30 anos de união. Me assusta ver que isso está acontecendo num ritmo acelerado em casais com menos de cinco anos de matrimônio.

Síndrome é o conjunto dos sinais e sintomas que caracterizam determinada condição ou situação. Por desconexão conjugal estou me referindo a um distanciamento afetivo, um esfriamento na relação, uma perda de qualidade no tempo juntos e na comunicação. Ambos (ou, às vezes, se torna mais acentuado em um dos cônjuges) perdem o prazer pelo tempo a sós, pelo namoro, pela alegria de viver o casamento como uma aventura, uma realização, um projeto de Deus. Desconexão conjugal tem a ver com perder o coração do outro. A relação cai numa rotina, numa mesmice, sem graça e sem poesia.

Constatei que parte das minhas intervenções, seja no pastoreio, nas mentorias e no consultório, tem sido no sentido de ajudar maridos e esposas a se reconectarem, para com base nisso tratarmos as diversas demandas do relacionamento conjugal.

Esse fenômeno tem levado vários casais a optarem pelo caminho aparentemente mais fácil: o divórcio. Outros decidem permanecer na relação usando máscaras, sem se darem a conhecer nem buscando ajuda. Optam por viverem debaixo do mesmo teto, entre as quatro paredes, como se fossem dois estranhos. Quando param e voltam no tempo, ficam perplexo ao lembrar de como tudo começou e a que situação chegaram.

Mas, afinal, o que está acontecendo com os casais?

Há vários fatores que contribuem para esse problema, mas optei aqui por destacar aqueles que considero os principais:

  1. Ritmo de vida acelerado: o envolvimento nas demandas pessoais ligadas aos estudos, trabalho, ministério, vai se tornando prioridade acima da relação. Em muitos casos, a intenção é boa, mas é feita em detrimento do cônjuge. A pessoa se levanta bem cedo e dorme tarde demais. Mas há também aqueles que desenvolveram um comportamento distorcido e se tornaram workaholics (viciado em trabalho – “fazedores”)…, pessoas que vivem numa insatisfação permanente. Elas fazem o dobro do que um indivíduo normal faria com a motivação de provar, por exemplo, que não são fracassadas, buscando o tempo todo reconhecimento e aprovação por parte dos outros. Pessoas com o ritmo de vida acelerado geralmente se encaixam dentro do quadrante 1 da matriz de gerenciamento pessoal, que tem a ver com aquilo que é importante, mas que se tornou urgente. O resultado é cansaço, esgotamento, estresse, ansiedade, porque está o tempo todo apagando incêndio, na tentativa de resolver conflitos e crises. Em Efésios 5:15,16, o apóstolo Paulo faz uma advertência: “Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, e sim como sábios, remindo o tempo, porque os dias são maus.” O ritmo de vida acelerado, invertendo valores e prioridades, é o estilo de viver dos néscios. Mais cedo ou mais tarde, a conta chegará e será muito cara para o casal e a família.
  2. Inabilidade na resolução dos conflitos: todo casal tem conflitos por diferentes motivos. Por incrível que pareça, isso mostra que são saudáveis. Ausência de conflitos na relação pode apontar para disfuncionalidades. A questão é saber com que frequência os conflitos acontecem e qual a sua intensidade. Cônjuges com inabilidade na resolução dos conflitos tem prazo de validade. Conflitos nascem de fagulhas que pouco a pouco se transformam num grande incêndio. Se são frequentes e intensos, com o passar do tempo contribuem para o distanciamento afetivo, frustrações e mágoas. Sem reconhecimento do mal que estão causando mutuamente, sem confissão, perdão, arrependimento e reparação, o casal se isola, evitando um ao outro, quebrando a comunhão, e isso leva para a desconexão. Amós 3:3 diz: “Andarão dois juntos, se não houver entre eles acordo?” A resposta é óbvia. NÃO. Sem acordo, entendimento, comunhão, não andarão juntos e se afastarão. E isso nos leva ao fator seguinte.
  3. Déficit na agenda emocional: com os conflitos frequentes, intensos e não resolvidos, o casal acumula situações estressantes e a relação fica desatualizada. Depois de algum tempo percebe-se um enorme déficit emocional que se caracteriza por mágoas, ressentimentos e raiva um do outro. Com a alma ferida tornam-se incapazes de ouvir o coração de forma recíproca, mesmo quando o que está sendo dito é uma expressão da verdade. Esse quadro torna-se ainda mais grave quando o cônjuge veio para o casamento com déficit emocional que se originou no ambiente familiar, quando criança e adolescente. Se já existia na pessoa um esquema desadaptativo de abandono, privação emocional, desconfiança, dependência e incompetência etc., o reservatório emocional estará vazio e será necessária ajuda profissional para auxiliar o indivíduo a superar essas questões psicológicas. Em Efésios 4:32, Paulo nos entrega um mandamento do Senhor que se aplica a todos na igreja e igualmente aos casados em Cristo quando consideramos que, antes de serem marido e esposa, são irmãos em Jesus: Antes, sede uns para com os outros benignos, compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus, em Cristo, vos perdoou.” Sem abertura de coração, confissão, arrependimento e liberação de perdão de ambos os lados, a agenda emocional bloqueará a relação e o casal dificilmente seguirá em frente.
  4. Ausência de comunicação: tudo seria mais fácil se os casais soubessem pelo menos conversar, fazer uma DR (Discussão da Relação). Mas é incrível perceber que a maioria não tem a mínimo noção de como sentar para ter uma boa, honesta e educada conversa. Não conseguem OUVIR sem interromper, sem buscar primeiro entender, sem legitimar o que o cônjuge está sentindo. Não conseguem FALAR em amor, sem acusar, sem julgar, sem levantar a voz, sem ironias. Não conseguem NEGOCIAR demandas simples do dia relacionadas a casa, agenda, trabalho, filhos, igreja, parentes, dinheiro… a “comunicação” que existe entre eles é superficial. Não sabem como ter uma conversa da alma, expressando bem o que pensam e o que sentem. Sem comunicação profunda de qualidade, é impossível haver conexão. É simples assim. Tiago 1:19 diz “Sabeis estas coisas, meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar”. Ef 4: 29, 30: “Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, e sim unicamente a que for boa para edificação, conforme a necessidade, e, assim, transmita graça aos que ouvem. E não entristeçais o Espírito de Deus, no qual fostes selados para o dia da redenção.”.
  5. Distanciamento de Deus: deixei esse fator por último por considerar ser o centro do que estamos abordando. Guardem bem essa frase: “Quanto mais próximo o casal está de Deus, mais próximo estarão um do outro. Quanto mais longe o casal estiver de Deus, mais longe estarão um do outro.”

A relação com Deus o Pai se estabelece por meio do seu Filho Jesus Cristo: “(…) ninguém vem ao Pai senão por mim” (João 14:6). Se marido e esposa, individualmente, já nasceram de novo por obra e graça do Espírito Santo, que convenceu e levou cada um a crer no sacrifício de Cristo mediante o arrependimento e confissão para salvação, então a relação com Deus Pai se tornou uma realidade. Mas uma coisa é ter RELAÇÃO com Deus; a outra é ter COMUNHÃO com Deus. A comunhão é precedida da relação. Quando a comunhão com Deus está interrompida, o que veremos no cônjuge são as marcas do pecado descritas em Gálatas 6:19-21 “Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções, invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam. Mas quando o cônjuge está vivendo em comunhão com Deus o que vemos são as marcas do Espírito listadas em Gálatas 6:22-23 “Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei. E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências”. Viver em comunhão com Deus é desfrutar de uma vida na luz, cheia do Espírito Santo e revelando o fruto do mesmo na nossa maneira de pensar, sentir e nos comportar com nosso cônjuge. Essa vida de intimidade espiritual com Deus possibilita o viver conectado no sentido físico, emocional, espiritual e geográfico no casamento e nos dá as condições e a capacitação para superação dos problemas anteriormente citados que nos levam à desconexão.

Reflexão

  1. Você tem se sentido conectado ao seu cônjuge? Percebe o mesmo na relação dele com você?
  2. Qual dos fatores listados estão presentes no seu casamento?
  3. Tem algum casal amigo em que confiam, que poderia ajudá-los numa mentoria para resolver esse problema?

Sugestão

  • Compartilhe com seu cônjuge esse artigo e converse sobre o mesmo com ele.
  • Se precisarem de ajuda, façam contato conosco para mostrarmos algumas alternativas de apoio para seu casamento.

Pr. David R. Sales, missionário Sepal e psicólogo