De 23 de julho a 08 de agosto muitas pessoas acompanharam e vibraram com as competições das Olimpíadas de Tóquio. Muitos brasileiros se entristeceram com o desempenho de Gabriel Medina, mas se alegraram com a medalha de ouro de Ítalo Ferreira, no surfe. A inserção de novas modalidades esportivas, como o surfe e o skate, além do excelente desempenho das mulheres nos jogos olímpicos, colocaram o Brasil em 12º lugar no ranking total de medalhas. Com destaque para a prata de Rayssa Leal no skate e para o ouro de Rebeca Andrade no salto.
O evento olímpico também foi permeado por algumas situações polêmicas. Uma delas foi a desistência de Simone Biles, capitã da equipe olímpica de ginástica feminina dos EUA e a ginasta americana mais condecorada de todos os tempos. Ela retirou-se da competição por equipes após atuações atípicas tanto no salto quanto no solo e também se afastou da competição individual geral, citando a necessidade de dar atenção ao seu bem-estar mental.
O caso de Simone Biles despertou uma série de debates, entre elogios e críticas. A verdade é a competição promovida nos Jogos Olímpicos propiciam algumas reflexões interessantes acerca de temas como disciplina, superação, vitória, sucesso e fracasso.
Timothy Dalrymple, presidente e CEO da Christianity Today, conta[i] como sonhou em ser um grande atleta olímpico até que sua promissora carreira foi interrompida por um grave acidente. Dalrymple escreve:
“O ano era 1984 e as Olimpíadas foram realizadas em Los Angeles. Famílias ao redor do mundo se reuniram em torno de suas televisões brilhantes enquanto histórias de luta e vitória inundavam suas salas de estar. Eu tinha oito anos e estava extasiado. O mais cativante de tudo foi a equipe masculina de ginástica conquistando a medalha de ouro. Minha alma foi elevada. Isso me inspirou a começar uma carreira na ginástica. Encheu minha mente com imagens brilhantes quando me deitei para dormir. Isso me sustentou por incontáveis horas de treinamento e uma série de ferimentos excruciantes. Levei-me por todo o país e até mesmo pelos oceanos, quando me tornei campeão nacional júnior e membro da seleção nacional. Isso até me levou a uma faculdade que eu nunca poderia pagar de outra forma e a um campeonato no meu primeiro ano na Universidade de Stanford. Então desabou. Poucos meses antes das seletivas olímpicas de 1996, caí da barra horizontal e quebrei o pescoço. Em um piscar de olhos, minha carreira de ginástica terminou em fracasso e uma sentença vitalícia de danos na coluna e dor crônica.”
Vocação e fracasso
Saindo da arena esportiva e adentrando ao mundo ministerial, eclesiástico e missionário, não é difícil encontrar pastores e líderes que lidam com os mesmos dilemas e desafios: disciplina, dedicação, superação, vitória e fracasso. O grande problema da questão é que em muitos casos, os parâmetros do mundo esportivo e corporativo são os que estão dando o norte para alguns ministérios, quando, na verdade, deveriam ser guiados pelos parâmetros e princípios bíblicos.
Há uma linha muito fina que separa nossas crenças de nossas ações concretas. Não há dúvida que muitos pastores, líderes e missionários conheçam a Bíblia e os valores que devem nortear seus projetos ministeriais. No entanto, estamos imersos numa sociedade profundamente competitiva, onde a cultura empresarial e pragmática, muitas vezes, se sobrepõe ao modelo bíblico de ministério.
Somos uma sociedade narcisista que valoriza demasiadamente a aparência. O jornalista Felipe Pena, fala[ii] que no mundo mediado pelas redes sociais o virtual acaba se sobrepondo ao real e nessa inversão a regra é ser uma pessoa de sucesso ou, pelos menos, fingir ser. Outro ponto de vista que o jornalista destaca é a causa das nossas frustrações. Segundo ele, nos frustramos porque nos enchemos de expectativas e, assim, iniciamos projetos pensando na recompensa que receberemos ao final da jornada e acabamos esquecendo que o que vale mesmo não é o objetivo final, mas sim o que é experimentando durante o trajeto da caminhada.
Mas, afinal, é possível anular essa influência da sociedade e sintonizar nossas expectativas e motivações do serviço ministerial com os parâmetros do reino de Deus? O que define um ministério bem-sucedido? Quais as marcas de um pastor de sucesso? Como podemos medir o êxito de um projeto missionário? O que significa fracassar no reino de Deus? Essas perguntas não têm respostas fáceis, mas queremos oferecer alguns insights e reflexões.
Josué Samuel Sälzer[iii], escreveu sobre o tema “Fracasso e Sucesso no ministério pastoral”. De acordo com Sälzer, as aparências não podem ser determinantes na definição do tema e os meios utilizados para conquistar algo mostra o que está implícito por trás do suposto sucesso e fracasso. Sälzer argumenta: “O exemplo do profeta Jeremias mostra que a obediência a Deus é o fator principal dentro do tema sucesso ministerial, em contraste a isso, a desobediência à Palavra de Deus resulta em fracasso espiritual e ministerial, por mais que os números digam o contrário”.
O autor acrescenta: “É preciso entender que o sucesso não é qualquer realização humana, mas sim a realização do propósito de Deus através da vida de seus servos, enquanto o fracasso pode sinalizar uma vida espiritual vazia e falha, mesmo que aparentemente seja tranquila e bem-sucedida aos olhos humanos.”
A verdade pode parecer óbvia, mas precisa ser dita: os fins nunca justificam os meios e os resultados não podem ser os únicos parâmetros para avaliar sucesso ou fracasso. Há verdadeiros homens e mulheres tementes a Deus, com uma conduta fiel às Escrituras, trabalhando em projetos e ministérios que, aos olhos humanos, parecem um total fracasso – isso porque costumamos avaliar os números ou os resultados a curto prazo. Mas também há ministérios expressivos e notadamente bem-sucedidos em números que são resultados de projetos e ministérios regados com piedade e fidelidade a Deus. Porém, mais que avaliar aquilo que é possível ver ou apalpar ao final de um projeto ministerial é importante analisar e observar a trajetória.
Há algo de bom no fracasso?
Timothy Dalrymple diz que o fracasso é essencial para a vida atlética. Ele afirma: “O sonho olímpico anima dezenas e talvez centenas de milhões em todo o mundo a perseguir sonhos que nunca alcançarão – mas, ao se empenharem por esses sonhos, eles se tornam mais o que deveriam ser”.
Em conversa com outros atletas olímpicos sobre suas experiências, Dalrymple ouviu deles “que nunca se tratou realmente dos Jogos Olímpicos em si. Era sobre as pessoas em que se tornaram na busca pela excelência”. Embora muitos anseiem as medalhas, o percurso para chegar a elas é o mais interessante e pode ser recheado de percalços, alguns acidentes e fracassos. “A vitória, quando chegou, foi traiçoeira. Ameaçou desfazer o que o fracasso fez. A vitória é mais perigosa para a alma, a derrota mais instrutiva”, concluiu Dalrymple.
É importante dizer que não se trata de romantizar o fracasso, pois nem sempre ele tornará a pessoa mais forte ou resultará em preciosas lições, especialmente se for um fracasso resultante de uma atitude notadamente pecaminosa. Dalrymple argumenta: “Algumas falhas são tão devastadoras ou tão completas que pode ser difícil encontrar um arco redentor. Algumas falhas nos tornam mais amargos do que melhores”.
Ao olhar o fracasso em outra perspectiva, como algo instrutivo, é um exercício que pode ser muito interessante, afinal, a Bíblia está repleta de histórias de fracasso. Abraão e Moisés poderiam ter se tornado exemplos de fé se não tivessem falhado? Davi poderia ter escrito seus salmos? O Mestre em Eclesiastes tentou encontrar sentido nas buscas do mundo, e somos abençoados pela sabedoria que ele adquiriu com o fracasso. Pedro e Paulo teriam se tornado instrumentos flexíveis nas mãos de Deus se não tivessem sido humilhados por seus fracassos?
Após uma extensa pesquisa para abordar o assunto desenvolvido nesse artigo, somos tentados a finalizar apresentando “uma grande lição”, ou indicando “a chave para o sucesso ministerial”, ou ainda enumerando “passos para evitar o fracasso”. Mas vamos optar por outro caminho e finalizar lembrando que Deus nunca prometeu sucesso; vocação não significa notoriedade; números não são parâmetros no reino de Deus; o evangelho avança pela graça de Deus e com o trabalho de pessoas comuns; pessoas sujeitas ao erro e ao fracasso, mas que perseveram na caminhada, enquanto se tornam as pessoas que Deus quer que sejam; que levantam ao caírem e entregam a Deus qualquer glória e louvor, resultantes de suas ações de obediência, amor e serviço, ao próximo e ao mundo.
Por Phelipe Reis | Jornalista e colaborador de conteúdo para o site Sepal.